ENTREVISTA
Jean-Yves Leloup
No blog AUM MAGIC, o encontro com a
entrevista interessante, uma aula para toda vida em questão de minutos de leitura.
O ser humano Jean-Yves Leloup ensina, sem se deixar
cegar pela escolha do dogma que prega.
Palavras que suavizam e remetem cada vez mais ao desejo de ver habitando esse lindo planeta Terra, seres que se completam, conscientizados e que se enxergam uns nos outros.
Juntos, em harmonia, usufruem de toda a magia que é experimentar viver o Paraíso na Terra.
Palavras que suavizam e remetem cada vez mais ao desejo de ver habitando esse lindo planeta Terra, seres que se completam, conscientizados e que se enxergam uns nos outros.
Juntos, em harmonia, usufruem de toda a magia que é experimentar viver o Paraíso na Terra.
Quando eu me preocupo com a sociedade, eu me transformo. Cuidar
do outro me revela a mim mesmo. Quando conheço o outro, conheço a mim mesmo. O
Evangelho de São Tomé diz que o Reino está no interior e no exterior. Se o
Reino estivesse somente no interior, poderíamos abandonar o mundo e viver
apenas em meditação. Se o Reino estivesse só no exterior, não teríamos que
meditar, e poderíamos ocupar-nos o tempo todo da sociedade. Mas o que Jesus
fala é que o Reino está dentro e fora (...)
Tenho a impressão de que o Brasil não tem uma coisa ou
outra, ele tem todas as coisas. E há a riqueza da natureza, a riqueza das
culturas mescladas. Mas sinto que no mundo político há alguma coisa artificial.
Vejo a humanidade em uma situação de apocalipse,
entendendo a palavra apocalipse como revelação. Há algo
desmoronando, e há também algo que está nascendo. Nós escutamos o barulho do
carvalho que cai, mas não escutamos o barulho da floresta que brota. Ouvimos o
ruído das torres desmoronando, mas não escutamos a consciência que desperta. No
mundo de hoje há muitas coisas que desmoronam, e em geral falamos das
coisas que fazem ruído, mas não falamos das sementes de consciência e de luz
que estão germinando.
Nascido em 1950, na França, ele é um
dos pensadores importantes do mundo contemporâneo. Filósofo, terapeuta
transpessoal, teólogo, padre da igreja ortodoxa na França e traduziu e
interpretou textos bíblicos. Seu pensamento é poético, universalista,
multidimensional. Conferencista reconhecido internacionalmente, ele vem
regularmente ao Brasil proferir seminários organizados pela Universidade da Paz.
Para Marie de Solemne, uma
estudiosa da sua obra, “a considerável força da palavra de Jean-Yves Leloup é que ela é sistematicamente informada, ao mesmo
tempo, por uma reflexão filosófica, psicanalítica e espiritual”. Os livros de
Jean-Yves estão publicados em vários idiomas e fazem sucesso no Brasil. Entre
os seus últimos lançamentos estão “Amar ... Apesar de Tudo” e “A Arte da
Atenção”, ambos da Editora Verus. A entrevista a seguir foi concedida na sede
da Unipaz, em Brasília.
Você é sacerdote da igreja ortodoxa...
Jean-Yves Leloup - A ortodoxia é a tradição das origens do cristianismo.
Inicialmente, o cristianismo era uma comunhão de igrejas. Havia a igreja de
Jerusalém, a de Antióquia, a de Éfeso, a de Roma. Foi só no século 12 que a
igreja de Roma se separou. As diferentes igrejas ortodoxas preservaram a
tradição de comunhão e permaneceram unidas apesar das diferenças.
Você acredita em Astrologia?
Jean-Yves Leloup – O homem é uma parte do universo e depende dos
astros. Isso faz parte da sua unidade com o cosmo. Gosto das palavras de Santo
Tomás de Aquino, que diz que os homens dependem dos astros, mas são
maiores do que eles. Não somos completamente determinados pelos astros. O homem
é uma mistura de natureza e de aventura. Creio na Astrologia, mas não no
determinismo.
Quando você diz que aceita postulados da
Astrologia, essa é uma opinião pessoal ou é um consenso em sua igreja?
Jean-Yves Leloup – Na igreja ortodoxa há diferentes
teólogos, com pontos de vista diversos. A linha de pensamento em que estou
engajado respeita a Astrologia. A consciência da relação do homem com o
universo, a consciência da sua liberdade e a consciência daquilo que o
ser humano faz em relação ao universo – essas são questões muito tradicionais.
No seu livro A Arte da Atenção, você
define o oceano como “um deserto em movimento”. O deserto parece ser um dos
seus temas constantes. Se para você o deserto é uma metáfora,
ele simboliza o quê?
Jean-Yves Leloup – Simboliza o silêncio – o silêncio
de onde vem a palavra e para onde a palavra volta. O deserto é também uma
metáfora da vacuidade – a vacuidade de onde vem o mundo e para onde esse mundo
volta. Quando estamos no deserto, nesse espaço de silêncio, nós nos
aproximamos dessa vacuidade essencial e não somos distraídos pelas formas.
Entramos em contato com o que não tem forma — a origem de todas as formas.
Jean-Yves Leloup – A reencarnação é uma explicação
possível. Ela é importante para dar-nos um sentido de responsabilidade e para
colocar-nos em contato com as conseqüências dos nossos atos. A idéia de
reencarnação está ligada à idéia de justiça e à lei do Carma. O Evangelho diz
que o que você planta, você colhe. Nesse sentido, a idéia da reencarnação pode
ser útil. Mas os grandes sábios da Índia dizem que a reencarnação é uma crença
popular e uma forma de interpretar o que está além do espaço e do tempo. Crer
na reencarnação é acreditar na continuidade do espaço-tempo. Por isso, há
uma diferença entre reencarnação e ressurreição. O objetivo humano é sair do
ciclo da reencarnação e atingir um estado de ressurreição que está além da
necessidade de reencarnar e constitui uma libertação. Quando perguntaram ao
indiano Ramana Maharshi para onde ele iria depois da sua morte, ele
respondeu: “irei para onde sempre estive”. Ele não fala de reencarnação, nem do
encadeamento de causas e efeitos. Ele destaca que há dentro de nós algo que
está livre da roda de causas e efeitos, livre do samsara. É esse estado de
despertar que devemos descobrir.
O que é Deus? É uma entidade antropomórfica que
toma decisões como se fosse um ser humano, com seu hemisfério cerebral
esquerdo, que gosta ou não gosta, que se apega ou rejeita algo? Ou Deus é
apenas uma Lei Universal?
Jean-Yves Leloup – Cada um tem sua religião conforme o seu nível
de consciência. Nossa imagem de Deus é feita de acordo com o que a nossa
consciência pode conter. É por isso que existem imagens de Deus muito infantis
– Deus como uma grande mãe ou um grande pai, como uma fonte de segurança.
Meister Eckhart escreveu que, para alguns, Deus é como uma vaca leiteira,
algo que tem que suprir as nossas necessidades. Para outros, Deus é aquilo que
coloca em ordem a sociedade humana e o universo, é a lei natural. Para outros,
ainda, Deus é apenas uma palavra, e tudo o que podemos pensar de Deus não é
Deus, mas apenas a nossa representação dele. Assim, também, o que conhecemos da
matéria não é a matéria, mas apenas o que os nossos instrumentos de compreensão
nos permitem perceber. Por isso, quando usamos a palavra Deus, é bom saber do
que estamos falando. Ao longo da nossa vida pessoal, nossa imagem de Deus pode
mudar. Aquilo que a gente aprendeu no catecismo, em outro momento ganha outro
significado. O que aprendemos sobre Química no primeiro grau não é o que
aprendemos na universidade. Às vezes, no entanto, ficamos fixados nas
imagens da escola de primeiro grau. O mais importante, claro, é a nossa
experiência. O que quero dizer quando falo de Deus? Que experiências estão por
trás dessa palavra? Para mim, essa é uma experiência de serenidade, de
silêncio, de amor, e de luz.
Em seus livros, você aborda “a memória do corpo”.
Jean-Yves Leloup – O corpo é a nossa memória mais arcaica. Tudo
aquilo que uma criança viveu fica guardado na forma de impressões em seu corpo.
Quando tocamos um corpo, tocamos toda essa memória. Assim, você não pode tocar
determinadas pessoas em determinadas áreas, porque ali há registros de memórias
antigas. Karl Graf Dürkheim dizia que quando fazemos massagem em alguém, não estamos
tocando um corpo, estamos tocando uma pessoa. O corpo é animado, pleno de
memórias.
Como você vê a relação entre o individual e o
social? Penso que ficamos capengas se nos engajamos na transformação
social sem fazer uma autotransformação, mas também ficamos incompletos se
tentamos uma autotransformação sem levar em conta a sociedade ao nosso
redor.
Jean-Yves Leloup – É importante observar as duas coisas.
Isso me faz lembrar do que me disse um rabino em Jerusalém: que nunca haverá
paz, em Jerusalém, enquanto o ser humano não fizer a paz dentro de si mesmo. E
fazer a paz em Jerusalém significa fazer a paz nos diferentes bairros. O bairro
judeu, o bairro árabe, o bairro cristão, etc. Nós também temos que
construir essa paz nos nossos diferentes bairros, o bairro do coração, o bairro
da mente, o bairro do corpo. Se fizermos paz em nosso próprio interior,
poderemos fazer a paz no mundo. Há uma interpenetração do individual e do
social. Quando eu me preocupo com a sociedade, eu me transformo. Cuidar do
outro me revela a mim mesmo. Quando conheço o outro, conheço a mim mesmo. O
Evangelho de São Tomé diz que o Reino está no interior e no exterior. Se o
Reino estivesse somente no interior, poderíamos abandonar o mundo e viver
apenas em meditação. Se o Reino estivesse só no exterior, não teríamos que
meditar, e poderíamos ocupar-nos o tempo todo da sociedade. Mas o que Jesus
fala é que o Reino está dentro e fora, e eu acho que esse é o segredo do amor.
Porque o amor é aquilo que o ser humano tem de mais interior e, ao mesmo tempo,
ele tem conseqüências no mundo exterior.
Qual é o impacto que a busca espiritual dos
indivíduos tem, ou que deveria ter, sobre as estruturas sociais? A nossa
cultura espiritual, hoje, não deveria incluir uma preocupação explícita com
mudanças sociais?
Jean-Yves Leloup – Não há oposição entre o que é interior e o
que é exterior. Cada um deve seguir aquilo que o espírito lhe inspira. Para
alguns, é através da ação que se ama. Para outros, é através da meditação
ou da oração. A ação e a contemplação são como os dois olhos em um mesmo olhar.
Às vezes o amor nos convida à interiorização. Em outros momentos o amor nos
leva a agir, a produzir. A única condição necessária é que façamos todas as
coisas a partir do melhor de nós mesmos. Não se deve comparar a ação de Madre
Teresa com a ação de um eremita dentro de sua gruta. Cada um age da sua maneira
pelo bem-estar da humanidade.
Como você vê, hoje, a marcha da evolução humana?
Jean-Yves Leloup – Vejo a humanidade em uma situação de
apocalipse, entendendo a
palavra apocalipse como revelação. Há algo desmoronando, e
há também algo que está nascendo. Nós escutamos o barulho do carvalho que cai,
mas não escutamos o barulho da floresta que brota. Ouvimos o ruído das torres
desmoronando, mas não escutamos a consciência que desperta. No mundo de hoje há
muitas coisas que desmoronam, e em geral falamos das coisas que fazem
ruído, mas não falamos das sementes de consciência e de luz que estão
germinando.
Qual o significado do ascetismo no caminho
espiritual?
Jean-Yves Leloup – O ascetismo é um caminho para prazeres
mais sutis.
O que separa uma religião da outra?
Jean-Yves Leloup – Creio que é a ignorância, junto com a
vaidade e o desejo de poder. Quando você conhece o outro, você o respeita. Se
não há desejo de poder, há lugar para todos. Em um canteiro de flores há lugar
para as flores azuis, para as brancas, e cada uma delas cresce em direção à luz.
O que as religiões têm a ensinar umas às outras?
Jean-Yves Leloup – Cada uma pode ensinar às outras a sua
diferença, o que a distingue. Não podemos fazer um buquê, se todas as
flores tiverem a mesma cor. Se todas as pessoas pensam igual, então elas
não pensam mais. O pensamento dos outros estimula o nosso pensamento. A maneira
como os outros consideram o absoluto me permite relativizar minha própria
maneira de considerar o absoluto. Isso me impede de construir um dogma
e me leva a um conhecimento mais profundo.
Como você vê o Brasil?
Jean-Yves Leloup – Tenho a impressão de que o Brasil não tem uma
coisa ou outra, ele tem todas as coisas. E há a riqueza da natureza, a riqueza
das culturas mescladas. Mas sinto que no mundo político há alguma coisa
artificial. Sinto que há uma esquizofrenia. O Brasil tem uma coisa muito forte,
espontânea, próxima do paraíso, talvez, mas há também algo que impede o
surgimento desse paraíso.
Existe uma relação entre a atenção e o desapego...
Jean-Yves Leloup – Se estivermos realmente atentos, estaremos
dentro de um instante. Só podemos estar atentos instante a instante. Mas se
estivermos atentos a esse instante estaremos desapegados em relação ao instante
anterior. A atenção é a arte de viver no momento presente, e para isso é
preciso estar livre do passado e do futuro. A arte da atenção é a arte de estar
no presente. O presente está ligado ao passado e ao futuro, mas ao mesmo tempo
ele está desapegado em relação a eles. Isso me faz pensar em umas palavras de
Buda que têm relação com uma das perguntas feitas há pouco. “Se você quiser
conhecer sua vida anterior”, disse o Buda, “esteja atento para o que você é e
faz hoje”. Aquilo que você é hoje é o resultado do que você foi. Se você quiser
conhecer a sua vida futura, esteja atento para o que você é e faz hoje. Porque
o que você é hoje constitui a origem do que virá mais tarde. Há também as
palavras de Cristo, “não olhe para trás e não se preocupe com o futuro, mas
faça bem aquilo que você tem de fazer no momento presente”.
[Esse texto de Carlos C. Aveline, que transcreve uma entrevista com Jean-Yves
Leloup, foi publicado originalmente na revista “Planeta”, de São Paulo,
edição de outubro de 2002. ]
Fonte:http://www.unipazrecife.org.br/TextosSite/EntrevistacomJeanYves.htm
http://padmashanti.blogspot.com.br/2015/03/o-barulho-da-floresta-que-brota.html?
http://padmashanti.blogspot.com.br/2015/03/o-barulho-da-floresta-que-brota.html?
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